Revisitar a Ilíada é um gesto que tenta olhar para a própria génese da humanidade, é vasculhar as nossas origens para constatar que pouco o nada mudou na condição humana desde que o homem fixou a sua existência dentro da pólis. Continuamos a viver a angústia da morte e a tentar encontrar
um sentido para tudo isto.
A Ilíada, originalmente cantada por Homero, versa sobre vida, sobre o homem e as suas batalhas metafóricas e reais, pessoais e coletivas, concretas ou imaginárias. Fala-nos sobre a luta pela sobrevivência e o pouco espaço que nos resta para
encontrar o sentido da vida.
Versa sobre uma guerra que parece não ter fim, sobre as
nossas guerras diárias em busca da felicidade, porque é de felicidade que se trata. Neste espetáculo, veremos fragmentos de uma história cantada a quase três mil anos. Veremos imagens de uma guerra que dura mais de nove anos e que supostamente teve o seu início num gesto de amor
desenfreado.
Pessoalmente nunca percebi, bem ao certo, se o início de tanta violência se dá pelo amor à Helena ou pelo simples fato de termos nascido, nascidos para amar e odiar esta guerra que nos consome diariamente.
O certo é que Agamémnon, após o sacrifício de sua filha Ifigénia atracou nas praias de Troia trazendo consigo milhares e milhares de homens, um exército repleto de reis. Com mais de mil navios os aqueus desembarcaram com o propósito de subjugar as muralhas intransponíveis de Ílion, e assim, resgatar Helena. Helena a metáfora perfeita, a mais bela dentre todas as mulheres.
Se olharmos com atenção para os aqueus e seus navios, acampados junto ao mar, veremos uma turba de homens e a multiplicidade de um exército completo e numeroso, as várias faces da dimensão humana, do outro, a hospitaleira e acolhedora cidade de Troia, cidade de homens e mulheres com muitos afazeres, com as suas muralhas intransponíveis e heroicamente defendidas por Heitor.
Heitor o filho querido! Filho primogénito de Hécuba e Príamo. Heitor, o irmão! Protetor do jovem Páris.
Heitor o marido! A quem Andrómaca dedica o seu amor incondicional.Heitor! O pai atencioso e protetor!
Heitor! O amigo e baluarte dos troianos! Defensor de Troia e seus habitantes.
Nesta Ilíada veremos o Homem em luta com um dos seus grandes dilemas. Sair para territórios hostis em busca do desconhecido do reconhecimento, da fama, das recompensas, das glórias para encontrar a felicidade através de um simulacro de imortalidade ou permanecer entre os seus, em territórios nativos, no conforto do lar, dentro das próprias muralhas que nos definem, limitam e encerram, mas que nos trazem segurança e tranquilidade e principalmente nos aproximam das pessoas amadas.